Na pequena Linha Berlim, interior do município de Westfália (RS), o tempo parece ter parado. Em meio a plantações e galpões de madeira, Hugo Pott, de 68 anos, é um dos últimos artesãos do estado a manter viva uma tradição secular trazida da Alemanha: a confecção manual dos sapatos de pau.
Bisneto de imigrantes, Hugo aprendeu o ofício em uma oficina promovida pela prefeitura local, em 2018, e desde então se dedica a transformar blocos de madeira em relíquias culturais. “As pessoas ficam impressionadas com o trabalho, com toda a técnica artesanal. É como se elas estivessem voltando ao passado. Transformar um pedaço de madeira em um sapato representa uma verdadeira arte”, diz.

O passo a passo da tradição
A produção dos sapatos começa com a escolha da madeira, geralmente canela, conhecida pela leveza e resistência. Após ser deixada de molho por até dois meses, a madeira é moldada com machado, formão e grosa. Hugo esculpe cada par com precisão e cuidado, respeitando o formato do pé e dando acabamento com lixamento, verniz e tiras de couro. Na sola, sempre marca com orgulho suas iniciais: “HP”.
A dedicação é visível em cada detalhe, desde o corte bruto até a finalização delicada com moldes e ferramentas específicas como goivas e formões. O resultado é um calçado que ultrapassa a funcionalidade — é memória viva da cultura dos antepassados.

Relíquia que se tornou peça de arte
Hoje, os sapatos de pau produzidos por Hugo não são mais usados no cotidiano, mas continuam brilhando nos palcos com o grupo de dança folclórica Westfälische Tanzgruppe, do qual ele faz parte. Cada par custa R$ 250 (tamanho grande) ou R$ 100 (miniatura), sendo este último bastante procurado como lembrança artesanal.
Na confecção dos modelos pequenos, Hugo prefere madeiras como timbaúva e caroba, mais leves e maleáveis. “Antigamente, até para ir à igreja se usava sapato de pau. O modelo especial tinha uma tira de couro chanfrada”, relembra o marceneiro.

Entre curiosos e alunos
Por anos, Hugo abriu as portas de seu galpão para visitas escolares, mostrando passo a passo da produção e contando a história dos sapatos. O espaço limitado, no entanto, o fez interromper as atividades. “A Prefeitura poderia oferecer um local para receber visitas e realizar oficinas – como um pequeno ateliê, por exemplo –, onde os alunos pudessem aprender e, quem sabe, se apaixonar pela arte dos sapatos de pau”, sugere.
Preservar é resistir
A dedicação de Hugo Pott é mais do que um ofício: é uma resistência cultural. Em um tempo de avanços tecnológicos e padronização da produção, ele mantém viva a memória dos que cruzaram o oceano com suas tradições e ferramentas. Produzindo cerca de 30 pares por ano, Hugo se destaca como um guardião da identidade cultural do Sul do Brasil, provando que, mesmo com o passar do tempo, algumas tradições ainda caminham firmes — com sapatos de madeira.
Fonte: Deutsche Welle
Reportagem de Luciano Nagel em Westfália, RS. 03/03/20253 de março de 2025
Edição: Cristiane Marcelino
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